O Quarto do Menino

"No meu quarto que eu lia, escrevia, desenhava, pintava, imaginava mil projetos, criava outros mil objetos... Por isso, recebi o apelido de 'Menino do Quarto', título que adotei como pseudônimo e hoje, compartilho neste 'Quarto Virtual do Menino', o que normalmente ainda é gerado em meu próprio quarto". Bem, esse início já é passado; o 'menino' se casou (set/2008); há agora dois quartos, o do casal e o da bagunça... Assim, diretamente do quarto da bagunça, entrem e fiquem a vontade! Sobre a imagem de fundo: A primeira é uma reprodução do quadro "O Quarto" de Vicent Van Gogh; a segunda, é uma releitura que encontrei no site http://www.computerarts.com.br/index.php?cat_id=369. Esta longe de ser o MEU quarto da bagunça, mas em 2007, há um post em que cito o quadro de Van Gogh. Como disse, nada mais propício!!!... Passaram-se mais alguns anos, e o quarto da bagunça, já não é mais da bagunça... é o Quarto do Lorenzo, nosso primogênito, que nasceu em dezembro de 2010!

domingo, março 22, 2020

O Homem ideal


            

               Este homem existe.
            Para preservar a sua identidade e garantir-lhe o direito de ir e vir e ser o que quiser, vamos apelida-lo de Ferreirão.
            Ferreirão, homem de meia idade, forte, cabelos levemente grisalhos, se gabava dentre muitas outras coisas de ser o garanhão em pessoa.
            Muitas pessoas são assim; espalham sua imagem como se vêem. Agora, se o são realmente, é outra história.
            Não que Ferreirão falhava no seu papel de galanteador... apenas faltava-lhe naturalidade em certos pontos. Malandro, no trabalho finge que trabalha. Os subordinados, estes sim, pegam no batente. É um sarro vê-lo como uma barata tonta quando o patrão aparece: e ele, é claro, quer aparecer. Ah, Ferreirão, deixa de lorota!
            É uma piada, às vezes, o saco dos subordinados enche, mas Ferreirão é Ferreirão, não se toca, não muda nem por milagre.
            Detalhe: Ferreirão é casado, leva, até como bom chefe a família; mulher, filha e filho. Sempre atento nos assuntos familiares e muito prestativo.
            Mas que virilidade é esta que não deixa ele (e muitos outros) serem apenas homem de uma mulher. Um defeito? Desde que o mundo é mundo, o homem é assim. E pelo andar da carruagem não há que o fará mudá-lo!
            Ainda bem!, dizem as amantes. A de Ferreirão é a secretária do Dr. Hamilton. Não conhecem? Bem, só o Ferreirão mesmo. Não só conhece como ele até come. Já o doutor em questão nem existe. É um código, entende: “Ferreirão, o Dr. Hamilton está na linha!”, “Ferreirão, o Dr. Hamilton pediu para você ligar para ele”.
            Os subordinados, depois de descoberto este insuspeito código de comunicação – não vamos deixar de elogiar a inteligência dos ativamente sexuados, a do Ferreirão e da secretária do fictício Dr. Hamilton – fica até difícil dizer: “Ferreirão, é o Dr. Hamilton na linha”... quando eles sabem que não é. E agora também nós que lemos até aqui.
            Ferreirão não deixa passar despercebido qualquer corpão-violão que passa pela sua vista. Come com os olhos: “Que gostosona, vem cá chuchu. Faz carinho aqui no papai, faz.”
            Ferreirão, além de tudo, faz brincadeiras (de mau gosto) com quem não devia mexer. Tem um funcionário, vamos dizer, obediente às Leis de Deus. E veio ele, Ferreirão, todo malandrão, balançando as pernas, gemendo e olhando para este funcionário, disse:
- “Jeremias, to com uma vontade de trepar!”
Os outros em volta, não imaginavam que Jeremias, tão na sua e tão sabiamente, deixou Ferreirão com cara de palhaço, que faz a piada e é, ele próprio o motivo da piada, obrigado a dar uma risadinha sem graça e sair mais que depressa. Jeremias olhou-o e disse simplesmente:
- “Tem um monte de árvore lá fora!”
Esperaram Ferreirão sair, sem ter conseguido ferir Jeremias com sua malícia, para caírem na gargalhada. Ficaram vermelhos, choraram de tanto rir. Ferreirão nunca mais se atreveu com Jeremias.
Suas investidas nas mulheres devem ser tantas e muitas delas, nada agradáveis, que surgem as “indelicadas”.
Uma dessas foi seca e direta.
Discou o número do celular de Ferreirão e como de costume, não foi ele quem atendeu. Pode estar do lado do celular, finge que não é com ele. Ferreirão às vezes irrita com tanta folga e burrice: após atenderem o celular que é dele, tem a capacidade de perguntar: “É pra mim?”
Desta vez a voz do outro lado ouviu apenas o “Alô” do subordinado de Ferreirão e despejou:
- “Seu gordo, escroto!!”, com um tom ritmado de nojo, para deixar explícito que era isso que ela estava sentindo.
No primeiro instante o subordinado ficou paralisado:
“E agora, contar ou não contar, eis a questão?!”. “Conto!”. “Mas como?”. “Do mesmo jeito, ué!”. “Certo”. – um diálogo com ele mesmo.
- “Ferreirão, tem alguém com muita raiva de você”
- “É, por quê?”
- “Uma mulher ligou e disse: ‘Seu gordo, escroto!’” – o subordinado imitou até a entonação da voz, que era de nojo mesmo.
Ferreirão deu uma risadinha sem graça. Os outros funcionários riram, mas com mais vontade. E ele saiu de perto, mais uma vez como barata tonta.
- “Barata. Ah, eu odeio barata!”
No maior estilo feminino, esta frase é dita pelo másculo Ferreirão quando vê uma. Se fosse só a barata, afinal é um bicho tão nojento. Mas Ferreirão se deixa perder nos medos quando é apenas o Ferreira. Já o viram cambalear depois de uma trovoada, abaixando-se de qualquer coisa que pensasse poder o atingir (estava bem protegido dentro do prédio onde trabalha). Ao fechar a firma não pode ficar sozinho: tem medo de ser seqüestrado.
E por aí vai, Ferreirão com as mulheres, deixa seus instintos falarem mais alto. Ferreirão consigo mesmo, deixa o medo tomar-lhe conta.
Não bastasse tudo isso, tem os espetáculos quando se reúnem em confraternizações semanais regadas com muito álcool, churrasco, mais álcool, peixada e muito, muito mais álcool.
Esta aconteceu na mesa de truco:
- “Truco, filho da p* ! Desgra*...”
- “Seis, nojento, fidido!”
- “Nove, cachorro, corno...” (exagerado, eu).
Era tanta cerveja, muito líquido retido na bexiga e muito álcool afetando os neurônios que Ferreirão nem pensou duas vezes.
“É aqui mesmo”. E abriu a torneira. Sentado na mesa de truco, “levemente” alcoolizado como podem constatar, se mijou todo.
No serviço, foi piada por uma semana.
Este, meus caros e caras, é o Ferreirão. O homem ideal do título. Podem perceber, pelas atitudes exemplificadas, que ele não é tão difícil de encontrar por aí. Todos conhecem um...
E Ferreirão continua por aí, caçando os “pitéuzinhos”. Malandro que é malando não se dobra. Homem que é homem não se entrega.
- “Ferreirão, ligação no celular, tome”
- “É pra mim?!”

Escrita originalmente em 09/07/2000.

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