Este
homem existe.
Para
preservar a sua identidade e garantir-lhe o direito de ir e vir e ser o que
quiser, vamos apelida-lo de Ferreirão.
Ferreirão,
homem de meia idade, forte, cabelos levemente grisalhos, se gabava dentre
muitas outras coisas de ser o garanhão em pessoa.
Muitas
pessoas são assim; espalham sua imagem como se vêem. Agora, se o são realmente,
é outra história.
Não
que Ferreirão falhava no seu papel de galanteador... apenas faltava-lhe
naturalidade em certos pontos. Malandro, no trabalho finge que trabalha. Os
subordinados, estes sim, pegam no batente. É um sarro vê-lo como uma barata
tonta quando o patrão aparece: e ele, é claro, quer aparecer. Ah, Ferreirão,
deixa de lorota!
É
uma piada, às vezes, o saco dos subordinados enche, mas Ferreirão é Ferreirão,
não se toca, não muda nem por milagre.
Detalhe:
Ferreirão é casado, leva, até como bom chefe a família; mulher, filha e filho.
Sempre atento nos assuntos familiares e muito prestativo.
Mas
que virilidade é esta que não deixa ele (e muitos outros) serem apenas homem de
uma mulher. Um defeito? Desde que o mundo é mundo, o homem é assim. E pelo
andar da carruagem não há que o fará mudá-lo!
Ainda
bem!, dizem as amantes. A de Ferreirão é a secretária do Dr. Hamilton. Não
conhecem? Bem, só o Ferreirão mesmo. Não só conhece como ele até come. Já o
doutor em questão nem existe. É um código, entende: “Ferreirão, o Dr. Hamilton
está na linha!”, “Ferreirão, o Dr. Hamilton pediu para você ligar para ele”.
Os
subordinados, depois de descoberto este insuspeito código de comunicação – não
vamos deixar de elogiar a inteligência dos ativamente sexuados, a do Ferreirão
e da secretária do fictício Dr. Hamilton – fica até difícil dizer: “Ferreirão,
é o Dr. Hamilton na linha”... quando eles sabem que não é. E agora também nós
que lemos até aqui.
Ferreirão
não deixa passar despercebido qualquer corpão-violão que passa pela sua vista.
Come com os olhos: “Que gostosona, vem cá chuchu. Faz carinho aqui no papai,
faz.”
Ferreirão,
além de tudo, faz brincadeiras (de mau gosto) com quem não devia mexer. Tem um
funcionário, vamos dizer, obediente às Leis de Deus. E veio ele, Ferreirão,
todo malandrão, balançando as pernas, gemendo e olhando para este funcionário,
disse:
- “Jeremias,
to com uma vontade de trepar!”
Os outros em
volta, não imaginavam que Jeremias, tão na sua e tão sabiamente, deixou
Ferreirão com cara de palhaço, que faz a piada e é, ele próprio o motivo da
piada, obrigado a dar uma risadinha sem graça e sair mais que depressa.
Jeremias olhou-o e disse simplesmente:
- “Tem um
monte de árvore lá fora!”
Esperaram
Ferreirão sair, sem ter conseguido ferir Jeremias com sua malícia, para caírem
na gargalhada. Ficaram vermelhos, choraram de tanto rir. Ferreirão nunca mais
se atreveu com Jeremias.
Suas
investidas nas mulheres devem ser tantas e muitas delas, nada agradáveis, que
surgem as “indelicadas”.
Uma dessas foi
seca e direta.
Discou o
número do celular de Ferreirão e como de costume, não foi ele quem atendeu.
Pode estar do lado do celular, finge que não é com ele. Ferreirão às vezes
irrita com tanta folga e burrice: após atenderem o celular que é dele, tem a
capacidade de perguntar: “É pra mim?”
Desta vez a
voz do outro lado ouviu apenas o “Alô” do subordinado de Ferreirão e despejou:
- “Seu gordo,
escroto!!”, com um tom ritmado de nojo, para deixar explícito que era isso que
ela estava sentindo.
No primeiro
instante o subordinado ficou paralisado:
“E agora,
contar ou não contar, eis a questão?!”. “Conto!”. “Mas como?”. “Do mesmo jeito,
ué!”. “Certo”. – um diálogo com ele mesmo.
- “Ferreirão,
tem alguém com muita raiva de você”
- “É, por
quê?”
- “Uma mulher
ligou e disse: ‘Seu gordo, escroto!’” – o subordinado imitou até a entonação da
voz, que era de nojo mesmo.
Ferreirão deu
uma risadinha sem graça. Os outros funcionários riram, mas com mais vontade. E
ele saiu de perto, mais uma vez como barata tonta.
- “Barata. Ah,
eu odeio barata!”
No maior
estilo feminino, esta frase é dita pelo másculo Ferreirão quando vê uma. Se
fosse só a barata, afinal é um bicho tão nojento. Mas Ferreirão se deixa perder
nos medos quando é apenas o Ferreira. Já o viram cambalear depois de uma
trovoada, abaixando-se de qualquer coisa que pensasse poder o atingir (estava
bem protegido dentro do prédio onde trabalha). Ao fechar a firma não pode ficar
sozinho: tem medo de ser seqüestrado.
E por aí vai,
Ferreirão com as mulheres, deixa seus instintos falarem mais alto. Ferreirão
consigo mesmo, deixa o medo tomar-lhe conta.
Não bastasse
tudo isso, tem os espetáculos quando se reúnem em confraternizações semanais
regadas com muito álcool, churrasco, mais álcool, peixada e muito, muito mais
álcool.
Esta aconteceu
na mesa de truco:
- “Truco,
filho da p* ! Desgra*...”
- “Seis,
nojento, fidido!”
- “Nove, cachorro,
corno...” (exagerado, eu).
Era tanta
cerveja, muito líquido retido na bexiga e muito álcool afetando os neurônios
que Ferreirão nem pensou duas vezes.
“É aqui
mesmo”. E abriu a torneira. Sentado na mesa de truco, “levemente” alcoolizado
como podem constatar, se mijou todo.
No serviço,
foi piada por uma semana.
Este, meus
caros e caras, é o Ferreirão. O homem ideal do título. Podem perceber, pelas
atitudes exemplificadas, que ele não é tão difícil de encontrar por aí. Todos
conhecem um...
E Ferreirão
continua por aí, caçando os “pitéuzinhos”. Malandro que é malando não se dobra.
Homem que é homem não se entrega.
- “Ferreirão,
ligação no celular, tome”
- “É pra
mim?!”
Escrita originalmente
em 09/07/2000.
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