Isto que chamo de imaginário, não tem nada haver com invenção, fantasioso... é tudo aquilo que um dia fui e fiz, que ficou registrado naquele tempo e espaço e hoje, pelo fantástico poder da memória, faz parte do meu imaginário, que abrange etapas da minha infância e juventude e, o que hoje é o meu presente, amanhã, também fará parte deste imaginário.
O sentimento mais forte, os cenários e pessoas obrigatórias neste meu imaginário são aquelas que fazem parte da minha infância; meu bairro, as pessoas e suas casas, a dona Maria que cata lixo, o Carlinhos e suas seis filhas do bar, a Marisa da padaria, a Regina que tem uma síndrome, mas é super amiga e simpática e gostava de jogar vôlei na pracinha, aquela senhora e a filha que é doente e moravam em frente à mesma praça...
Pessoas com quem cruzei durante dias, meses, anos... ir e vir, estudar, trabalhar, passear... as pessoas estavam ali, em suas casas, com seus afazeres ou, simplesmente, sentadas na praça mesmo, durante as noites de verão, quando é quase impossível permanecer dentro de casa...
Nina é uma dessas pessoas. A Nina da esquina da rua debaixo, a mãe da Gisele que estudou comigo no colegial (mãe da Gislaine e do Ronaldo também) esposa do Geraldo, aquele que tirou meu RG quando eu tinha 9 anos de idade...
“Nina” é como todos a conhecem, como sempre a chamei desde pequeno, não sei seu nome de registro, mas é assim que está registrada em meu imaginário. Assim como estão registrados os “bom-dia, Nina”; “Tudo bem, André?”... Uma mulher grande, braços fortes, cabelos claros, curtos; avó de três ou quatro netos, filhos da Gisele e Gislaine. Uma mulher calma, serena... que contrasta, em muito, com sua constituição física. Em frente à sua casa há um jardim lindo, com flores muito coloridas, orquídeas talvez, vermelhas, amarelas, se soubesse e me interessasse pela botânica, saberia falar com mais propriedade e certeza, mas admiro a beleza apenas, como leigo...
Nina morreu... esta manhã! Minha mãe noticiou quando cheguei em casa por volta do meio-dia. Passei em frente a casa dela, na hora que fui para o meu destino de hoje e também no retorno... Aéreo talvez, não percebi nenhuma movimentação diferente.
Uma tristeza profunda me invadiu... não pela morte em si, inconformidade por ter ido, como pensou minha mãe... Minha tristeza era por saber que Nina não mais estaria na esquina, próxima ao seu jardim, com a mão amparada no portão amarelo, com sua silhueta gigante e calma...
Nina não estará em meu velório. Eu estarei no velório dela! E como em meu tempo de menino, quando os velórios aconteciam na sala das casas, Nina será velada na sala de sua casa, com uma imensa janela com vista para o belo jardim.
A mim resta-me o imaginário, este sobre o qual escrevi no início... nostálgico, no qual a Nina sempre estará presente!
André Coneglian
04 de março de 2006.
Ps.: Natalina é o seu nome, 54 anos de idade. Eu e minha mãe passamos rapidamente no velório, pela manhã de hoje (05/03). “Era melhor não ter ido; agora vou ficar com a imagem dela no caixão... preferia lembrar dela, de pé, lá na esquina, viva...” – expressou minha mãe; esboçando flashes do seu imaginário particular.
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