O silêncio é minha veste nesses dias. Não é meu traje favorito, entretanto, o provisório silêncio é um pijama confortável para noites de sono. O pijama pode até ser confortável, mas tranquilo não é o sono, nem a noite, o dia, tempo algum.
Cecília pede para dizer com poucas palavras aquilo que me atormenta... Não posso! Não consigo dizer com parcas “parole”... Há tanta dor, há tanto sofrimento... Dores e sofrimentos pessoais, não obstante, dói mais fundo a dor do coletivo.
Um coletivo de pobres e desassistidos! Pobres e desassistidos no qual me incluo - sem perspectiva de vacina e um retorno às atividades dos homens na Terra, todos abandonados e entregues ao deus Mercado e ao deus dará...
Despi-me brevemente de meu confortável silêncio-pijama por um motivo:
Ontem eu vi um pedido que me comoveu – sensível sempre fui; criei casca, transformou-se em couraça – mas encontro-me vulnerável.
Era uma jovem esposa clamando pela vida do jovem marido, internado com covid-19, com complicações no coração, ela pedia a todos, no vídeo.
“Tão corriqueiro nesse 2020 e 2021”, 240 mil pessoas perderam a vida. “Ah, mas afinal morreremos todos um dia”, podem argumentar os céticos, negacionistas e alienados alinhados ao bolsohitler tupiniquim.
Esse pedido foi diferente, foi feito em Língua Brasileira de Sinais, ela e ele são Surdos. Por que me comoveu tanto? A resposta não é simples, por isso, dizer com poucas palavras é difícil...
Há muitos anos uma amiga Surda chorou desesperadamente para mim. Não me recordo de choro mais triste, brotado no mais profundo âmago da alma, som gutural de quem não se ouvia a voz.
Não há palavra em Português, em Libras, em nenhuma língua para acalmar esse som gutural... Apenas abracei!
O clamor da jovem esposa em Língua de Sinais pelo jovem marido, para rezarmos/orarmos em favor dele, junto com suas lágrimas, foram como punhais em meu já abalado coração.
- Senhor das nossas pobres almas, que Sua Soberana Vontade alcance esse jovem casal. Os ouvidos surdos não ouvem som humano, mas creio que suas almas/espíritos podem ouvir o Céu.
Aproveito e peço pelo povo brasileiro: cego, surdo e mudo, hipnotizados por discursos e práticas de ódio e de homicídio em massa – armas ao invés de vacinas! – guiados por um “líder” desde sempre questionável, evidentemente equivocado, despreparado, que nunca escondeu suas intenções malignas.
Quase despi todo o pijama. Todavia, volto a ele, ao silêncio contemplativo. Sigo clamando, sigo pedindo. Que nossas súplicas – em alta voz, em meio tom, em silêncio, em Língua de Sinais, sejam todas atendidas.
Amém.
André Coneglian
17 fev. 2021
* Poema de Cecília Meireles, com
mesmo título: “Dizei-me com poucas palavras”